18/10/2010 - 20h10
EUA reconhecem que Irã tem papel-chave para resolver conflito no Afeganistão
DE SÃO PAULO
DA REUTERS, EM ROMA
Atualizado às 20h27.
Os Estados Unidos reconheceram que o Irã desempenha um papel importante na solução do conflito no Afeganistão, disse nesta segunda-feira o enviado americano Richard Holbrooke, no momento em que Teerã participa pela primeira vez de conversas internacionais sobre o país asiático.
O Grupo Internacional de Contato sobre o Afeganistão se reuniu nesta segunda-feira, em Roma, com a participação inédita do Irã. Os quase 50 representantes do grupo discutem o progresso da transferência das responsabilidades de segurança para as forças afegãs.
O objetivo do governo americano é começar a retirar algumas tropas americanas do Afeganistão até julho de 2011, um objetivo que sempre pareceu ambicioso diante da força taleban no país, mesmo após oito anos de guerra.
"A história aqui é muito simples. Esta é a primeira vez que os iranianos participam dessa reunião", disse Holbrooke em entrevista coletiva. Ele acrescentou que Washington não tem nenhuma objeção à presença de seu inimigo de longa data nas negociações.
"Nós fomos perguntados se tínhamos algum problema com isso, e dissemos "não'", explicou Holbrooke, o representante especial dos EUA para Afeganistão e Paquistão.
"Nós reconhecemos que o Irã, com sua longa e quase completamente aberta fronteira com o Afeganistão e com um enorme problema com drogas... tem um papel a desempenhar na resolução pacífica dessa situação no Afeganistão. Então, para os EUA, não há problema em sua presença."
Os Estados Unidos têm sistematicamente acusado o Irã de ajudar insurgentes no Afeganistão. Teerã nega que esteja apoiando grupos militantes no local, e diz que a instabilidade é resultado da presença das tropas ocidentais.
O representante especial do Irã, Mohammed Ali Qanezadeh, disse hoje que os principais problemas na região são insegurança, tráfico de drogas e a presença de forças estrangeiras, mas ele disse que as conversas em Roma têm sido "frutíferas".
Questionado qual seria a melhor solução, ele disse: "Eu acho que [uma solução] regional, mas a solução regional tem de ser apoiada pela comunidade internacional".
A conferência de Roma, organizada antes de uma cúpula da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) prevista para o próximo mês em Lisboa, examinou o processo de transição, já que neste território as perdas para os países ocidentais atingiram níveis recordes e que a opinião pública demonstra cansaço com esta guerra.
FOCO
O Irã, de maioria muçulmana xiita, é fortemente oposto ao estritamente sunita Taleban quando o grupo governou o Afeganistão, de 1996 a 2001. Teerã agora tem crescente influência econômica no país, especialmente no oeste afegão por meio do comércio via fronteira.
Holbrooke disse que as conversas entre os dois lados no encontro de hoje se limitaram ao Afeganistão.
"O que nós estamos discutindo aqui não é afetado, nem será afetado, pelos assuntos bilaterais que são discutidos em qualquer outro lugar em relação ao Irã", disse o americano.
Os Estados Unidos e as potências ocidentais acusam o Irã de querer desenvolver armas nuclear, mas Teerã nega, e defende que seu programa nuclear tem fins meramente pacíficos.
TALEBANS
"Queremos tentar atingir um objetivo realista para garantir uma estabilidade suficiente para o Afeganistão e para os direitos humanos essenciais", declarou à imprensa Michael Steiner, emissário alemão para a região, que presidiu o encontro na capital italiana.
Steiner destacou que o processo de transição começará em 2011 e deverá terminar em 2014, mas o Afeganistão continuará a receber ajuda internacional mesmo após a retirada das tropas estrangeiras.
Segundo ele, será preciso acelerar o treinamento das forças afegãs e atingir uma "estabilidade suficiente" no território para que o processo de transferência do controle do país para as forças locais seja "irreversível".
Os participantes das discussões deram apoio às negociações entre o governo de Cabul e os talebans, segundo Steiner.
"Não podemos resolver o conflito militarmente. Será preciso um processo político, nós devemos apoiar o governo afegão", acrescentou.
Holbrooke varreu as críticas contra essas negociações.
"Há espaço no Afeganistão para todos os que quiserem a reconciliação", disse, pedindo aos insurgentes que abaixem as armas.
"Não é uma derrota. Dizemos sempre que não iríamos conduzir essa batalha por meios militares", adicionou.