N° Edição: 2358
| 06.Fev.15 - 20:00
| Atualizado em 07.Fev.15 - 11:19
Como Vaccari movimentou US$ 200 milhões em propinas para o PT
Revelação de delator aumenta o impacto político da Lava Jato e, conforme antecipou ISTOÉ, o cerco se fecha em torno do tesoureiro do PT
Josie Jeronimo (josie@istoe.com.br)
A Polícia
Federal deflagrou na madrugada da quinta-feira 5 mais uma etapa da
Operação Lava Jato. Ela foi batizada de My Way. Seguindo rastros obtidos
com a delação premiada do ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, 200
agentes cumpriram 62 mandados em São Paulo, no Rio de Janeiro, na Bahia e
em Santa Catarina. Na ação da semana passada – a nona desencadeada
desde março –, pela primeira vez uma subsidiária da Petrobras, a BR
Distribuidora, entrou no foco dos investigadores. Até a oitava fase,
apenas as diretorias de serviços, internacional e abastecimento da
estatal concentravam as denúncias. A maior novidade, no entanto, está no
alcance político do trabalho policial. Agora, a PF aponta as suspeitas
para o tesoureiro do PT, João Vaccari. O dirigente partidário foi levado
para prestar depoimento e sua casa foi vasculhada durante o cumprimento
de mandados de busca e apreensão.
As declarações de Barusco reforçam os
indícios de que Vaccari ocupa lugar de destaque na rede criminosa
instalada dentro e em torno da Petrobras. Para a PF, ele foi guindado de
mero tesoureiro para a condição de operador do esquema. Na última
semana, reportagem de ISTOÉ já havia mostrado as estreitas ligações do
tesoureiro do PT com a empreiteira Schahin, uma das empresas
investigadas pela Lava Jato mais próximas do partido. Surgem “as
digitais do tesoureiro” na Lava Jato, estampou a matéria. A partir das
informações divulgadas na Operação May Way, sabe-se agora que, de 2003 a
2013, o tesoureiro do PT recebeu entre US$ 150 milhões e US$ 200
milhões em propina na intermediação de 90 contratos superfaturados da
companhia com empresas investigadas pela Lava Jato. As revelações que
comprometem ainda mais Vaccari foram feitas por Pedro Barusco. “Houve
pagamento de propinas em favor do declarante (Barusco) e de Renato
Duque, bem como em favor de João Vaccari Neto, representando o Partido
dos Trabalhadores”, diz trecho do documento prestado à PF. Renato Duque,
a quem Barusco era subordinado, ocupou o cargo de diretor de serviços
da Petrobras até 2012.
Em planilhas de pagamentos apreendidas, o
tesoureiro do PT é identificado como “Moch”, por estar sempre carregando
uma mochila. O ex-gerente calculou o montante de US$ 200 milhões para o
PT levando em conta a parcela que ele e Duque receberam nas negociatas:
US$ 50 milhões. Na regra de divisão da quadrilha, o PT era o que mais
recebia. “Dois terços para João Vaccari, um terço para a Casa 1 e um
terço para a Casa 2”, afirma o delator. “Casa 1” era o termo usado para
as propinas angariadas no âmbito da diretoria de serviços da companhia e
“Casa 2” se referia à Sete Brasil, empresa criada com apoio da
Petrobras para produzir sondas de exploração do pré-sal. O próximo passo
da Polícia Federal é tentar descobrir onde esses US$ 200 milhões foram
parar. Dados de 20 contas no exterior foram entregues à força-tarefa da
Lava Jato. Só na negociação com sócios do estaleiro Kepell Fels, Vaccari
teria recebido US$ 4,5 milhões. Algumas vezes, a propina era paga em
jantares em hotéis de luxo do Rio de Janeiro e de São Paulo.
O depoimento de Barusco foi feito em
novembro. Antes de colocar as diretorias da Petrobras chefiadas pelo PT
no centro do escândalo, a força-tarefa se dedicou ao cartel formado
pelas empreiteiras. Os detalhes da rede de corrupção fornecidos pelo
ex-gerente retratam como a legenda transformou a indicação de Renato
Duque em uma mina de recursos ilícitos. Por ter foco no ex-diretor, a
operação da semana passada ganhou a alcunha de “My Way”, canção de Frank
Sinatra usada por Barusco quando queria se referir discretamente ao
chefe. Segundo o ex-gerente, o então diretor de serviços não precisava
nem mesmo cobrar o suborno, pois a propina “fazia parte da relação” com
os empreiteiros. Duque ganhou, no início de dezembro, habeas corpus do
STF, por isso não teve mandado de prisão decretado, apesar das
acusações. Na última semana, o procurador-geral da República, Rodrigo
Janot, voltou a defender a prisão do ex-diretor.
A atuação de Duque como arrecadador de
recursos com origem ilícita para as campanhas do PT foi detalhada por
Barusco para os integrantes da força-tarefa. O ex-gerente narrou um
episódio em que o ex-diretor se encontrou com Júlio Faerman,
representante da empresa holandesa SBM, para pedir doação de US$ 300 mil
para a campanha do partido em 2010. Conforme revelou ISTOÉ na edição
de 21 de novembro do ano passado, uma das linhas de investigação da
Polícia Federal aponta para a possibilidade de que recursos provenientes
de contratos com preços superfaturados tenham sido repassados como
doações eleitorais legais para quatro partidos da base parlamentar do
governo: PT, PMDB, PP e PTB. A força-tarefa, agora, tenta desvendar a
estratégia de dissolver a propina em doações autorizadas pela
legislação, o caixa 1.
Acossados pela May Way, o PT e o advogado
de Vaccari divulgaram nota em que fazem a defesa da lisura da
arrecadação do partido. “O PT não tem caixa 2, nem conta no exterior,
não recebe doações em dinheiro e somente recebe contribuições legais ao
partido”, afirma o texto. A situação para o partido, no entanto, começa a
se complicar. De tão assustado, Vaccari nem sequer abriu o portão
quando os policiais cumpriram mandado de busca na manhã da quinta-feira
5. Os agentes tiveram que pular o muro para entrar na casa do
tesoureiro, apreender documentos e conduzir o petista para prestar
depoimento. O presidente do PT, Rui Falcão, admitiu a interlocutores que
o quadro político “é grave”.
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