N° Edição: 2214
| 13.Abr.12 - 21:00
| Atualizado em 14.Abr.12 - 18:32
ESPIÃO
Antes de virar araponga particular, Dadá prestou serviços
à ditadura: foi infiltrado no MST e monitorou políticos
Em meio aos efeitos devastadores da Operação Monte Carlo, que prendeu
o bicheiro Carlinhos Cachoeira, arrastou para a lama o senador
Demóstenes Torres e lança suspeita sobre dois governos estaduais e a
empreiteira Delta, líder em contratos públicos, um personagem saiu da
sombra: o espião Idalberto Matias de Araújo. Conhecido como Dadá, ele
tem 51 anos, é ex-sargento da Aeronáutica e está preso em uma unidade
militar do Distrito Federal. Dadá é apontado pela Polícia Federal como o
principal articulador de uma ampla rede de gravações clandestinas que
vem assombrando Brasília há pelo menos uma década. Documentos e
gravações telefônicas já analisados por delegados que estão à frente da
Operação Monte Carlo indicam que as ações de Dadá extrapolam em muito os
limites do esquema montado por Cachoeira e não têm coloração partidária
ou ideológica. ISTOÉ obteve, com exclusividade, documentos sigilosos
sobre o araponga e conversou com amigos dele, ex-colegas de farda e do
submundo da espionagem. Em seu histórico de serviços oficiais prestados
ao Estado durante três décadas, Dadá acumulou prestígio invejável dentro
da comunidade de informações e fez amigos, muitos amigos, entre
políticos, empresários, policiais, promotores e procuradores. Quando
deixou de trabalhar para o Estado, Dadá se valeu dos antigos
relacionamentos para fins particulares e se tornou o araponga que mais
atemoriza os poderosos de plantão. De acordo com a Polícia Federal, Dadá
montou o maior esquema de espionagem da história recente do País.
Trabalhando na sombra, ele serviu e ajudou a derrubar políticos
influentes, como o ex-ministro José Dirceu, por exemplo. Teve
participação ativa na gravação que revelou um esquema de corrupção e
loteamento político nos Correios que levou ao escândalo do Mensalão e
influiu na celebração de contratos públicos em diversos setores.
Para manter em funcionamento um esquema que é capaz de gravar conversas telefônicas, eletrônicas ou pessoais, que acessa dados sigilosos da Receita Federal e dos mais variados órgãos de inteligência do governo federal e dos governos estaduais, Dadá tem a sua disposição uma equipe de colaboradores infiltrados em diversos órgãos. São agentes públicos que criminosamente vazam ao araponga informações sigilosas sobre pessoas e empresas e que também recebem de Dadá colaboração clandestina para investigações em curso. Um dos principais operadores do espião, segundo a PF, é o chefe do setor de Inteligência do Ministério Público do Distrito Federal, Wilton Queiroz. Gravações obtidas por ISTOÉ (leia quadro abaixo) mostram que Queiroz repassa ao espião dados confidenciais sobre inquéritos e processos que tramitam pelo MP. Com essas informações, Dadá pode prevenir seus clientes sobre futuras ações da Justiça. Em troca, o espião faz grampos clandestinos solicitados pelo promotor. Se as conversas interceptadas interessarem ao Ministério Público, posteriormente é obtida uma autorização judicial para a realização de gravações oficiais. Caso não interessem, o próprio Dadá tenta repassá-las a outros clientes. A PF já sabe que, além de Queiroz, há um outro promotor de Brasília que atua em parceria com o araponga: Libânio Alves Rodrigues, também mencionado nas gravações obtidas por ISTOÉ.
EMPREGADORES
O bicheiro Carlinhos Cachoeira (acima) e o senador Demóstenes Torres
contrataram Dadá para monitorar inimigos políticos e interceder em contratos públicos
Assim como os promotores, de acordo com as investigações da Operação
Monte Carlo, o espião conta com parceiros na Corregedoria da Polícia de
Goiás, nos serviços reservados das Polícias Civil e Militar de Goiás,
Distrito Federal, Mato Grosso, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Na
esfera federal, agentes da comunidade de informações do Exército, da
Aeronáutica e da Marinha ajudam Dadá na elaboração de dossiês, e agentes
da Abin contribuem para que o araponga obtenha dados bancários e
fiscais de pessoas físicas e jurídicas. Na rede de operadores do esquema
Dadá (leia quadro na pág. 46) também figuram delegados da própria
Polícia Federal, já investigados pela Corregedoria.
Maranhanse de Bacabal, Dadá chegou a Brasília junto com os fundadores da capital no início da década de 1960. Sem estudos, buscou na Aeronáutica um meio de sobrevivência. Serviu cerca de seis anos como taifeiro e foi trabalhar na 2ª Seção, o setor de informações da FAB. “Dadá não sabia cozinhar. Não tinha futuro como taifeiro”, ironiza um colega. Em plena ditadura, da 2ª Seção ele foi para o temido Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa), agência integrante do SNI, o aparato repressivo criado pelos militares. Sem formação para o trabalho interno, de análise, Dadá tornou-se agente de campo. Fez curso de operações no Cefarh, antiga Esni (Escola Nacional de Informações), e passou a atuar na coleta de dados na Seção de Busca da Divisão de Operações. Sua missão inicial era colher dados sobre pessoas que os militares chamavam de subversivos. Foi dessa maneira que começou a construir relações com a Polícia Federal e as PMs de vários Estados.
Mantida em segredo até agora, uma das primeiras missões do araponga a serviço do Estado foi monitorar o advogado e ex-deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh. Em 1980, o petista fundou em São Paulo o Comitê Brasileiro de Solidariedade aos Povos da América Latina (CBS), grupo de direitos humanos que fazia denúncias de tortura durante a ditadura e crítica aberta à doutrina de Segurança Nacional que ainda predominava no Brasil. Dadá integrou a equipe que seguia os passos do advogado, registrava seus encontros com membros de partidos até então clandestinos e grupos de esquerda de outros países, como Cuba e Nicarágua. Depois, Dadá foi escalado para espionar os chamados movimentos sociais. Foi ele o responsável pelas primeiras infiltrações no Movimento dos Sem-Terra (MST), por exemplo.
PATRIMÔNIO
Os rendimentos de Dadá se multiplicaram nos últimos três anos.
O apartamento em Brasília é avaliado em R$ 800 mil
Com a redemocratização do País, o sargento continuou a atuar nos
bastidores, mas ainda a serviço do Estado, e não de clientes
particulares. Colaborou com a PF em ações contra o narcotráfico em
Roraima e no Rio de Janeiro, especificamente na operação contra o
traficante carioca Ernaldo Pinto de Medeiros, o Uê. Ali, Dadá ajudou a
descobrir um esquema de desvio de armas envolvendo oficiais da própria
FAB.
De volta a Brasília, e com a comunidade de informações em declínio, Dadá mergulhou no submundo da espionagem clandestina. Ao contrário de boa parte dos antigos arapongas do regime militar que viraram detetives particulares e passaram a bisbilhotar a vida alheia em busca de casos de adultério, Dadá colocou seus conhecimentos e seus contatos a serviço de empresários e políticos. Em Goiás, no primeiro governo do tucano Marconi Perillo (1999-2002), o bicheiro Carlinhos Cachoeira implantou o jogo do bicho eletrônico e passou a administrar a loteria estadual. Para manter a jogatina, porém, ele precisava do apoio da polícia e acabou se aproximando de policiais civis amigos de Dadá. A ligação foi automática. Cachoeira contratou o espião e o aproximou do PM Jairo Martins, vulgo Índio, que passou a ser um colaborador habitual – como no caso da gravação do diretor dos Correios Maurício Marinho, episódio que levou à eclosão do escândalo do Mensalão.
Os esquemas montados por Dadá começaram a despertar a atenção da Polícia Federal durante a Operação Satiagraha. Quando o delegado e atual deputado Protógenes Queiroz (PCdoB - SP) começou a investigar o banqueiro Daniel Dantas, pediu ajuda a Dadá para recrutar freelancers, como o ex-agente do SNI Francisco Ambrósio, e até servidores da Abin. O problema é que o recrutamento e o consequente compartilhamento de dados sigilosos com agentes de fora da PF acabaram sendo um tiro no pé. A Satiagraha, deflagrada em 2008 com ampla cobertura midiática, virou um escândalo. As provas foram anuladas e Dadá e Protógenes tiveram suas carreiras abreviadas. O delegado se elegeu deputado. Dadá ficou queimado como agente da Aeronáutica e foi obrigado a se aposentar, com rendimento de R$ 4 mil mensais. Mergulhou de vez na clandestinidade e passou a operar como empregado de Carlinhos Cachoeira. A partir daí a vida do espião mudou.
INVESTIGAÇÃO
Sarney (à esq.) e Marco Maia articulam a instalação de
uma CPI no Congresso e querem ouvir o araponga
Casado com a enfermeira Maria de Lourdes Chagas e pai de dois filhos,
manteve por anos uma vida simples, instalado num apartamento funcional
da Asa Norte, bairro de classe média de Brasília. Com hábitos espartanos
e sem hobbies, Dadá tinha uma Variant II, 1972, de cor azul, que ele
chamava de “Mafalda”, por vezes abandonada sem combustível nas
entrequadras de Brasília. Mafalda foi substituída por um Corsa 2003, sem
ar-condicionado. Nos últimos três anos, porém, Dadá passou a circular
de Passat alemão. Comprou um Grand Vitara Suzuki e uma motocicleta. Em
janeiro de 2010, segundo a PF, comprou à vista um apartamento avaliado
em R$ 800 mil, mas cujo valor registrado em cartório foi de apenas R$
340 mil. O aumento patrimonial não foi declarado ao Fisco. As mudanças
afetaram o jeito de ser do espião. Além de ostentar roupas de grife, o
sargento adotou um tom esnobe. “O Dadá de hoje está irreconhecível.
Parece ter assimilado os trejeitos e práticas do chefe dele, o Carlinhos
Cachoeira”, diz um agente federal amigo do araponga. No mesmo ano de
2010, Dadá voltou às manchetes no caso do grupo de espionagem contratado
pelo PT para montar um dossiê contra o candidato tucano José Serra.
Pelo que se depreende da análise de diálogos e relatórios ainda inéditos da Operação Monte Carlo, obtidos por ISTOÉ, Dadá não mudou apenas seu estilo de vida. O ex-espião da FAB assumiu o papel de operador de Carlinhos Cachoeira e da empreiteira Delta. No governo de Goiás, coube a ele a indicação para diversos cargos do segundo escalão. Mais recentemente, ensaiava passos como empresário e sindicalista. Segundo a PF, Dadá é sócio oculto da Agência Plá junto a Marcelo Lopes, o Marcelão, ex-assessor da Casa Militar do Distrito Federal, e Cláudio Monteiro, ex-chefe de gabinete do governador Agnelo Queiroz. Além de expandir os negócios da Plá para Mato Grosso e Rio de Janeiro, Dadá, Marcelão e Monteiro teriam um projeto político independente de Cachoeira, mas que se beneficiaria dos contratos da Delta na área de limpeza urbana. Por isso, Dadá fundou em abril de 2011 a Associação Comunitária dos Trabalhadores em Limpeza Urbana do DF e Entorno. A ideia era evitar pressões sindicais contra a Delta e também mobilizar a massa de trabalhadores para eleger Monteiro deputado distrital, pelo PT.
Relatório reservado da PF ao qual ISTOÉ teve acesso com exclusividade mostra que, na busca e apreensão realizada no apartamento de Dadá, foram encontrados documentos “pertinentes à possível prática de espionagem”. Foram apreendidas mídias eletrônicas, pesquisas de bancos de dados privativos dos órgãos de segurança pública (Infoseg) e relatórios de interceptação de linhas telefônicas de investigações do Núcleo de Combate a Organizações Criminosas (NCOC) do Ministério Público em conjunto com a PF. Os acessos ilegais ao Infoseg tiveram como alvo o deputado federal Fernando Francischini (PSDB/PR), cujos e-mails também foram monitorados. O primeiro acesso foi feito em 25 de outubro de 2011, pelo agente da PF Paulo Áureo Gomes Murta, o Murtinha, amigo de Dadá. Outros dois acessos ao cadastro de Francischini foram efetuados pelos sargentos da PM Leonel Martins e Itaelson Rodrigues, lotados na Casa Militar do Distrito Federal por indicação de Dadá e comando do coronel Rogério Leão. Na época, o deputado vinha questionando possíveis desvios de recursos públicos ocorridos no Ministério dos Esportes e na Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Os telefonemas e e-mails de Francischini também foram acessados pelo agente da PF Joaquim Gomes Thomé Neto, que mora no Rio de Janeiro. Em depoimento sigiloso à Polícia Federal, obtido pela reportagem de ISTOÉ, Thomé admite que foi contratado por Dadá para fazer o trabalho sujo por R$ 3 mil mensais. Esses e outros dados levaram a PF a abrir uma investigação paralela à Monte Carlo para apurar todos os tentáculos do araponga. No Congresso, os presidentes da Câmara e do Senado, Marco Maia (PT-RS) e José Sarney (PMDB-AP), finalizam a instalação de uma CPI. Para deputados e senadores que irão trabalhar na investigação o primeiro desafio será fazer Dadá quebrar o silêncio.
Dadá e o submundo dos grampos
O ex-agente do serviço secreto da Aeronáutica está por trás dos mais recentes escândalos da República. Saiba quem o contratou, quais são seus operadores na polícia e no Ministério Público e como funciona o esquema do araponga
Claudio Dantas Sequeira
Assista ao vídeo que reúne os principais trechos dos diálogos mantidos pelo araponga Dadá:
ESPIÃO
Antes de virar araponga particular, Dadá prestou serviços
à ditadura: foi infiltrado no MST e monitorou políticos
Para manter em funcionamento um esquema que é capaz de gravar conversas telefônicas, eletrônicas ou pessoais, que acessa dados sigilosos da Receita Federal e dos mais variados órgãos de inteligência do governo federal e dos governos estaduais, Dadá tem a sua disposição uma equipe de colaboradores infiltrados em diversos órgãos. São agentes públicos que criminosamente vazam ao araponga informações sigilosas sobre pessoas e empresas e que também recebem de Dadá colaboração clandestina para investigações em curso. Um dos principais operadores do espião, segundo a PF, é o chefe do setor de Inteligência do Ministério Público do Distrito Federal, Wilton Queiroz. Gravações obtidas por ISTOÉ (leia quadro abaixo) mostram que Queiroz repassa ao espião dados confidenciais sobre inquéritos e processos que tramitam pelo MP. Com essas informações, Dadá pode prevenir seus clientes sobre futuras ações da Justiça. Em troca, o espião faz grampos clandestinos solicitados pelo promotor. Se as conversas interceptadas interessarem ao Ministério Público, posteriormente é obtida uma autorização judicial para a realização de gravações oficiais. Caso não interessem, o próprio Dadá tenta repassá-las a outros clientes. A PF já sabe que, além de Queiroz, há um outro promotor de Brasília que atua em parceria com o araponga: Libânio Alves Rodrigues, também mencionado nas gravações obtidas por ISTOÉ.
EMPREGADORES
O bicheiro Carlinhos Cachoeira (acima) e o senador Demóstenes Torres
contrataram Dadá para monitorar inimigos políticos e interceder em contratos públicos
Maranhanse de Bacabal, Dadá chegou a Brasília junto com os fundadores da capital no início da década de 1960. Sem estudos, buscou na Aeronáutica um meio de sobrevivência. Serviu cerca de seis anos como taifeiro e foi trabalhar na 2ª Seção, o setor de informações da FAB. “Dadá não sabia cozinhar. Não tinha futuro como taifeiro”, ironiza um colega. Em plena ditadura, da 2ª Seção ele foi para o temido Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa), agência integrante do SNI, o aparato repressivo criado pelos militares. Sem formação para o trabalho interno, de análise, Dadá tornou-se agente de campo. Fez curso de operações no Cefarh, antiga Esni (Escola Nacional de Informações), e passou a atuar na coleta de dados na Seção de Busca da Divisão de Operações. Sua missão inicial era colher dados sobre pessoas que os militares chamavam de subversivos. Foi dessa maneira que começou a construir relações com a Polícia Federal e as PMs de vários Estados.
Mantida em segredo até agora, uma das primeiras missões do araponga a serviço do Estado foi monitorar o advogado e ex-deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh. Em 1980, o petista fundou em São Paulo o Comitê Brasileiro de Solidariedade aos Povos da América Latina (CBS), grupo de direitos humanos que fazia denúncias de tortura durante a ditadura e crítica aberta à doutrina de Segurança Nacional que ainda predominava no Brasil. Dadá integrou a equipe que seguia os passos do advogado, registrava seus encontros com membros de partidos até então clandestinos e grupos de esquerda de outros países, como Cuba e Nicarágua. Depois, Dadá foi escalado para espionar os chamados movimentos sociais. Foi ele o responsável pelas primeiras infiltrações no Movimento dos Sem-Terra (MST), por exemplo.
PATRIMÔNIO
Os rendimentos de Dadá se multiplicaram nos últimos três anos.
O apartamento em Brasília é avaliado em R$ 800 mil
De volta a Brasília, e com a comunidade de informações em declínio, Dadá mergulhou no submundo da espionagem clandestina. Ao contrário de boa parte dos antigos arapongas do regime militar que viraram detetives particulares e passaram a bisbilhotar a vida alheia em busca de casos de adultério, Dadá colocou seus conhecimentos e seus contatos a serviço de empresários e políticos. Em Goiás, no primeiro governo do tucano Marconi Perillo (1999-2002), o bicheiro Carlinhos Cachoeira implantou o jogo do bicho eletrônico e passou a administrar a loteria estadual. Para manter a jogatina, porém, ele precisava do apoio da polícia e acabou se aproximando de policiais civis amigos de Dadá. A ligação foi automática. Cachoeira contratou o espião e o aproximou do PM Jairo Martins, vulgo Índio, que passou a ser um colaborador habitual – como no caso da gravação do diretor dos Correios Maurício Marinho, episódio que levou à eclosão do escândalo do Mensalão.
Os esquemas montados por Dadá começaram a despertar a atenção da Polícia Federal durante a Operação Satiagraha. Quando o delegado e atual deputado Protógenes Queiroz (PCdoB - SP) começou a investigar o banqueiro Daniel Dantas, pediu ajuda a Dadá para recrutar freelancers, como o ex-agente do SNI Francisco Ambrósio, e até servidores da Abin. O problema é que o recrutamento e o consequente compartilhamento de dados sigilosos com agentes de fora da PF acabaram sendo um tiro no pé. A Satiagraha, deflagrada em 2008 com ampla cobertura midiática, virou um escândalo. As provas foram anuladas e Dadá e Protógenes tiveram suas carreiras abreviadas. O delegado se elegeu deputado. Dadá ficou queimado como agente da Aeronáutica e foi obrigado a se aposentar, com rendimento de R$ 4 mil mensais. Mergulhou de vez na clandestinidade e passou a operar como empregado de Carlinhos Cachoeira. A partir daí a vida do espião mudou.
INVESTIGAÇÃO
Sarney (à esq.) e Marco Maia articulam a instalação de
uma CPI no Congresso e querem ouvir o araponga
Pelo que se depreende da análise de diálogos e relatórios ainda inéditos da Operação Monte Carlo, obtidos por ISTOÉ, Dadá não mudou apenas seu estilo de vida. O ex-espião da FAB assumiu o papel de operador de Carlinhos Cachoeira e da empreiteira Delta. No governo de Goiás, coube a ele a indicação para diversos cargos do segundo escalão. Mais recentemente, ensaiava passos como empresário e sindicalista. Segundo a PF, Dadá é sócio oculto da Agência Plá junto a Marcelo Lopes, o Marcelão, ex-assessor da Casa Militar do Distrito Federal, e Cláudio Monteiro, ex-chefe de gabinete do governador Agnelo Queiroz. Além de expandir os negócios da Plá para Mato Grosso e Rio de Janeiro, Dadá, Marcelão e Monteiro teriam um projeto político independente de Cachoeira, mas que se beneficiaria dos contratos da Delta na área de limpeza urbana. Por isso, Dadá fundou em abril de 2011 a Associação Comunitária dos Trabalhadores em Limpeza Urbana do DF e Entorno. A ideia era evitar pressões sindicais contra a Delta e também mobilizar a massa de trabalhadores para eleger Monteiro deputado distrital, pelo PT.
Relatório reservado da PF ao qual ISTOÉ teve acesso com exclusividade mostra que, na busca e apreensão realizada no apartamento de Dadá, foram encontrados documentos “pertinentes à possível prática de espionagem”. Foram apreendidas mídias eletrônicas, pesquisas de bancos de dados privativos dos órgãos de segurança pública (Infoseg) e relatórios de interceptação de linhas telefônicas de investigações do Núcleo de Combate a Organizações Criminosas (NCOC) do Ministério Público em conjunto com a PF. Os acessos ilegais ao Infoseg tiveram como alvo o deputado federal Fernando Francischini (PSDB/PR), cujos e-mails também foram monitorados. O primeiro acesso foi feito em 25 de outubro de 2011, pelo agente da PF Paulo Áureo Gomes Murta, o Murtinha, amigo de Dadá. Outros dois acessos ao cadastro de Francischini foram efetuados pelos sargentos da PM Leonel Martins e Itaelson Rodrigues, lotados na Casa Militar do Distrito Federal por indicação de Dadá e comando do coronel Rogério Leão. Na época, o deputado vinha questionando possíveis desvios de recursos públicos ocorridos no Ministério dos Esportes e na Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Os telefonemas e e-mails de Francischini também foram acessados pelo agente da PF Joaquim Gomes Thomé Neto, que mora no Rio de Janeiro. Em depoimento sigiloso à Polícia Federal, obtido pela reportagem de ISTOÉ, Thomé admite que foi contratado por Dadá para fazer o trabalho sujo por R$ 3 mil mensais. Esses e outros dados levaram a PF a abrir uma investigação paralela à Monte Carlo para apurar todos os tentáculos do araponga. No Congresso, os presidentes da Câmara e do Senado, Marco Maia (PT-RS) e José Sarney (PMDB-AP), finalizam a instalação de uma CPI. Para deputados e senadores que irão trabalhar na investigação o primeiro desafio será fazer Dadá quebrar o silêncio.
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