domingo, 2 de fevereiro de 2014

Acha que é só isto, tem muito mais por tras disto, e eles ainda ganhão recompença por tudo....

N° Edição:  2306 |  31.Jan.14 - 20:50 |  Atualizado em 02.Fev.14 - 20:06

Violenta, sem controle e impune

Com extrema agressividade, mostrando despreparo e ignorando seus superiores, a polícia do governador Geraldo Alckmin volta a agir de forma desproporcional durante manifestações na capital


Na segunda-feira 27 a Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo divulgou números locais sobre a violência em 2013 que até poderiam ser comemorados. Ainda que boa parte dos indicadores de crimes contra o patrimônio tenha registrado alta, a taxa de homicídios dolosos, considerada o principal dado internacional de criminalidade, registrou queda de 8,2%, a maior desde 2011. Mas a verdade é que os paulistas não têm muito o que comemorar, com a sua polícia violenta com os cidadãos, alheia às ordens de seus superiores, livre para agir com a certeza da impunidade e que tem protagonizado verdadeiros absurdos. Os últimos, registrados no dia 25, aniversário da cidade de São Paulo, durante manifestações contrárias à Copa do Mundo, dão uma medida do quão grave é a situação. “Estamos falando de uma violência que foge a qualquer padrão tolerável de segurança pública”, diz Luis Flávio Sapori, associado do Fórum de Segurança Pública e coordenador de um centro de estudos sobre o tema na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas). “Não há nada que justifique o que estamos testemunhando”, diz.
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DE NOVO
PM paulista exagera na repressão à manifestação "Não vai ter Copa",
em 25 de janeiro, aniversário da cidade de São Paulo
Dois casos de abuso marcaram essa última onda de violência policial no Estado. Um dos mais descarados se passou com uma garota que, depois de participar de uma manifestação no dia 25 nas proximidades da rua Augusta, região central de São Paulo, foi interceptada por oito policiais e golpeada com socos e pontapés. Em seguida, na calçada, foi atropelada propositalmente por uma moto da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas), da Polícia Militar (PM). Um morador de um prédio na região gravou o atropelamento e divulgou as cenas. “Como alguém que está ali para te proteger faz isso com você?”, questionou o pai da vítima em entrevista à Rádio BandNewsFM. Temendo represálias a ele e à filha, uma estudante do ensino médio de 18 anos, ele preferiu não se identificar. “Ainda não sabemos se vamos fazer uma denúncia formal”, disse.
Igualmente grave foi o que aconteceu com o estoquista Fabrício Proteus, 22 anos, no bairro de Higienópolis, também na região central. Diz a polícia que, ao ser abordado por três PMs na noite do mesmo dia 25, Proteus correu e, ao ser alcançado, sacou um estilete e tentou golpear um dos soldados. Em legítima defesa, diz a polícia, os soldados lhe deram dois tiros – um no tórax e o outro na base do pênis. Ao delegado do caso, os policiais sugeriram ainda que Proteus era um black block – grupo que vem sendo responsabilizado por ações violentas durante as manifestações – e que carregava objetos parecidos com explosivos. Internado em estado grave, o jovem só pôde dar sua versão dos fatos no dia 28 e desmentiu o relato dos policiais. Ele alegou que só sacou o estilete depois de tomar o primeiro tiro. Seu irmão também veio a público e disse, ainda, que Proteus não era um black block. “O que surpreende na história é que os policiais estavam armados”, diz Guaracy Mingardi, especialista em segurança pública. “É regra universal – quem vai fazer a segurança de uma manifestação não pode estar armado.”
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Ainda que o jovem tenha de fato sacado o estilete antes do primeiro tiro, como alegam os policiais, surpreende que três PMs treinados e bem equipados precisassem recorrer à arma de fogo para contê-lo. “A verdade é que a polícia tem hábitos muito ruins e uma espécie de predisposição para a violência”, diz Sapori, do Fórum de Segurança Pública. Embora a PM seja treinada para evitar tiros desnecessários – o método Giraldi, ensinado nas academias de polícia paulistas desde 1998, fala em esgotar todas as vias de negociação antes de sacar uma arma – no dia a dia, a truculência policial se sobrepõe. “Os PMs, embora treinados, valorizam mais o que dizem os colegas veteranos do que o que aprenderam na academia”, afirma Sapori. “E assim a cultura da violência, que não vem de hoje, se perpetua.”
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Apelar aos valores tipicamente militares, como a hierarquia e a obediência, para tentar coibir essa predisposição da instituição para a violência também não tem dado resultado. Desde as manifestações de junho de 2013, ninguém menos que o governador do Estado, Geraldo Alckmin (PSDB-SP), veio a público para fazer críticas duras ao comportamento de policiais que covardemente agrediram manifestantes. Era de se esperar que as críticas fossem ouvidas e que colocassem em curso um processo de mudança dentro da instituição. Mas não foi isso que aconteceu. Pelo contrário. Depois do que se viu no último dia 25, se escancarou o abismo entre o que o governador espera de sua polícia e como ela opera. Alckmin acabou publicamente desautorizado pelo comportamento de um órgão que deveria se submeter a ele, mas que funciona à margem de um controle real. É como se a instituição operasse autonomamente, sem precisar prestar contas a ninguém – nem ao governador.
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Também não ajuda o fato de que raramente são punidos os policiais flagrados cometendo abusos. Durante as manifestações de junho de 2013, por exemplo, não foram poucos os delitos policiais registrados em foto e vídeo – nem raras as promessas de que os excessos seriam punidos. Até hoje, porém, apenas dois inquéritos policiais militares foram abertos para apurar denúncias de erros e abusos supostamente praticados durante as manifestações de junho. As informações são poucas. A organização não governamental Conectas Direitos Humanos, por exemplo, tenta obter dados sobre as apurações da Secretaria da Segurança Pública do Estado desde 2013. A ONG fez, inclusive, um pedido por meio da Lei de Acesso à Informação que acabou negado sob a alegação de que o caso corre em sigilo. “É muito provável que nada tenha acontecido com os policiais que cometeram os delitos”, diz Rafael Custódio, advogado e coordenador do programa de justiça da Conectas. “As corregedorias de polícia são, tradicionalmente, corporativistas e tendem a interpretar qualquer tipo de questionamento como uma afronta”, afirma ele.
Pior. Com poucos corregedores, boa parte do trabalho de apuração acaba sendo feito pelos comandantes dos investigados – pessoas que não só convivem com os suspeitos, mas que, muitas vezes, deram as ordens que resultaram nos comportamentos abusivos. “Uma polícia assim faz sentido numa sociedade democrática?”, diz Custódio. A resposta é óbvia. O que não quer dizer que não precisamos de polícia. Longe disso. Hoje, vive-se o tempo da verdadeira insegurança, não mais da sensação de insegurança. Com 37 ônibus incendiados só na capital desde o começo do ano, ter polícia é uma necessidade. Mas manter a polícia como ela está é um crime, principalmente contra o cidadão.
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VIOLÊNCIA
Em 30 dias, 37 ônibus foram incendiados na capital paulistana
O caso dos ônibus queimados mostra o verdadeiro divórcio entre polícia e comunidade. Na periferia de São Paulo qualquer criança sabe que os ataques aos ônibus são arquitetados pelo crime organizado para transmitir recados às autoridades. Só na quarta-feira 29, por exemplo, é que o secretário da Segurança Fernando Grella admitiu essa hipótese e falou que tudo seria investigado a fundo. Com certeza, se reproduzirá a impunidade, que costuma vir depois das declarações de “rigorosa apuração”. E, segundo os especialistas, é essa impunidade que divorcia a polícia do cidadão e o aproxima da bandidagem.

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