N° Edição: 2193
| 18.Nov.11 - 21:00
| Atualizado em 19.Nov.11 - 07:17
DRAMA
Safia foi levada para o harém de Kadafi quando tinha apenas 15 anos
VIOLÊNCIA
Kadafi, que chegou a ter 400 guarda-costas mulheres, também
costumava usar as seguranças como alvo de abusos sexuais
Na entrevista ao “Le Monde”, Safia não entra em detalhes com relação à
guarda feminina de Kadafi, que chegou a reunir 400 mulheres. Quando
estava no poder, o ditador costumava dizer que preferia guarda-costas
mulheres, por serem mais “confiáveis”. Na cidade de Bengazi, no leste da
Líbia, o psicólogo Sehram Sergewa está preparando um relatório para o
Tribunal Penal Internacional que deve mostrar outras razões para a
preferência de Kadafi. De acordo com Sergewa, as guardas eram recrutadas
virgens e tinham de se manter assim até que o ditador, um de seus
filhos ou alguma alta autoridade do regime mantivesse relações sexuais
com elas. Cinco antigas guardas já prestaram depoimento ao psicólogo e
estão dispostas a testemunhar no tribunal, que tem sede em Haia, na
Holanda. “Uma delas, além de ser estuprada, foi chantageada. Disseram
que, se ela não virasse guarda-costas de Kadafi, seu irmão passaria o
resto da vida na prisão”, afirma Sergewa, acrescentando que um irmão
dessa testemunha era acusado de tráfico de drogas.
Questionada se estaria disposta a prestar depoimento num tribunal, Safia diz que gostaria, mas sabe que ficaria marcada para sempre. “A mulher é sempre considerada a culpada”, acredita Safia. “E Kadafi ainda tem seus seguidores.” Quanto ao passado de escrava sexual, quanto mais recorda, mais diz que gostaria de esquecer os tempos sob o jugo do ditador, que com frequência organizava para seus convidados festas à moda bunga bunga – o mesmo estilo que ensinou ao ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi. Safia diz que não participava das festas, nas quais era comum a presença de modelos italianas, belgas e africanas. Ela afirma também que Kadafi mantinha relações sexuais com outros homens e estava sempre sob efeito de cocaína: “Ele não dormia jamais.” Safia não esclarece esse ponto, mas há relatos de que Kadafi também era usuário contumaz de Viagra.
Durante os cinco anos em que viveu como escrava sexual de Kadafi, Safia conseguiu visitar a família em quatro ocasiões. Na última, em 2009, com a ajuda do pai, ela fugiu do país rumo à França, disfarçada de anciã. Um ano depois, voltou clandestinamente à Líbia, mas acabou fugindo de novo, em abril de 2011, desta vez para escapar da mãe, que queria casá-la com um parente idoso, viúvo. Abrigada na Tunísia, se casou em segredo com um rapaz jovem. O casal pretendia viver em Malta ou na Itália, mas os conflitos que sacodem o mundo árabe os separou. Sem notícias do marido e com o futuro incerto, Safia relembra sua reação à morte do ditador: “Quando vi o cadáver de Kadafi exposto à multidão, senti um breve prazer. Depois, veio um gosto amargo na boca.” Hoje, Safia não tem dúvidas: seria melhor que o ditador não tivesse sido executado no momento da captura, mas sim preso, para ser julgado por um tribunal internacional.
Bunga bunga de Kadafi
Depois da revelação de uma jovem que aos 15 anos se tornou escrava do ex-ditador, desvenda-se agora na Líbia o mundo de orgias, drogas e violência dentro do poder
DRAMA
Safia foi levada para o harém de Kadafi quando tinha apenas 15 anos
A bela morena de 22 anos não esconde o
nervosismo ao recordar o passado recente. “Muamar Kadafi roubou minha
vida”, afirma, referindo-se ao ditador que manteve por 42 anos um regime
de violência sem precedentes no país africano. Instalada em um hotel de
Trípoli, a capital da Líbia, a morena identificada apenas como Safia
tem dificuldade para relatar seu drama. Afinal, durante cinco anos ela
foi escrava sexual de Kadafi. Em entrevista à conceituada jornalista
Annick Cojean, do jornal francês “Le Monde”, Safia conta que tinha 15
anos quando foi escolhida para entregar flores a Kadafi, durante visita
que o ditador faria à escola em que ela estudava, em Sirte, no leste do
país. Convicta de que era uma “grande honra” oferecer as flores em nome
da escola, Safia não estranhou quando Kadafi acariciou seus cabelos
lentamente, depois de colocar as mãos sobre os seus ombros. Ela não
sabia que se tratava de um código do ditador para que seus guarda-costas
localizassem seu endereço. “Como suspeitar de alguma coisa? Ele era o
herói de Sirte”, explica Safia.
No dia seguinte, três mulheres de uniforme – Salma, Mabrouka e Feiza – apareceram no salão de beleza da mãe de Safia e levaram a garota, com o argumento de que Kadafi queria lhe dar “alguns presentes”. Em seguida, as mulheres levaram Safia para o deserto, onde Kadafi, então com 62 anos, passava uma temporada de caça. No acampamento, o ditador perguntou-lhe sobre a família, a vida que levava em Sirte, e, na sequência, convidou-a a viver com ele. “Você terá tudo o que deseja, casas, carros”, prometeu Kadafi, de acordo com o relato de Safia. “Eu garanto que seu pai vai compreender”, continuou Kadafi, antes de colocar Safia sob os cuidados de Mabrouka. Na prática, a garota não teve a opção de voltar para a casa dos pais.
Enquanto estavam acampados no deserto, Mabrouka tratou de providenciar roupas sensuais para Safia, além de lhe ensinar a dançar. Ainda no deserto, onde se encontravam pelo menos outras 20 mulheres, segundo Safia, ela foi obrigada a dançar para o ditador. Depois de observá-la, sem tocá-la, ele foi direto: “Você será minha puta.” Terminada a temporada de caça, Safia foi levada ao palácio, onde foi estuprada pelo ditador. “Ele continuou nos dias seguintes. Ele me estuprou por cinco anos”, diz Safia. Pelo seu relato, além de ser submetida à violência sexual, ela foi obrigada a adotar hábitos como fumar, tomar uísque e cheirar cocaína. Em junho de 2007, conta Safia, Kadafi a colocou na comitiva que o acompanharia durante uma viagem de duas semanas pela África, passando por Mali, Guiné, Serra Leoa, Costa do Marfim e Gana. Durante a viagem, ela era apresentada como integrante do corpo de guardas do ditador e usava um uniforme cáqui como disfarce. “O uniforme azul era o reservado às verdadeiras guardas”, diz Safia. Apesar de a garota não pertencer ao quadro de seguranças, Mabrouka a ensinou a usar um fuzil Kalashnikov, uma arma de fabricação soviética.
No dia seguinte, três mulheres de uniforme – Salma, Mabrouka e Feiza – apareceram no salão de beleza da mãe de Safia e levaram a garota, com o argumento de que Kadafi queria lhe dar “alguns presentes”. Em seguida, as mulheres levaram Safia para o deserto, onde Kadafi, então com 62 anos, passava uma temporada de caça. No acampamento, o ditador perguntou-lhe sobre a família, a vida que levava em Sirte, e, na sequência, convidou-a a viver com ele. “Você terá tudo o que deseja, casas, carros”, prometeu Kadafi, de acordo com o relato de Safia. “Eu garanto que seu pai vai compreender”, continuou Kadafi, antes de colocar Safia sob os cuidados de Mabrouka. Na prática, a garota não teve a opção de voltar para a casa dos pais.
Enquanto estavam acampados no deserto, Mabrouka tratou de providenciar roupas sensuais para Safia, além de lhe ensinar a dançar. Ainda no deserto, onde se encontravam pelo menos outras 20 mulheres, segundo Safia, ela foi obrigada a dançar para o ditador. Depois de observá-la, sem tocá-la, ele foi direto: “Você será minha puta.” Terminada a temporada de caça, Safia foi levada ao palácio, onde foi estuprada pelo ditador. “Ele continuou nos dias seguintes. Ele me estuprou por cinco anos”, diz Safia. Pelo seu relato, além de ser submetida à violência sexual, ela foi obrigada a adotar hábitos como fumar, tomar uísque e cheirar cocaína. Em junho de 2007, conta Safia, Kadafi a colocou na comitiva que o acompanharia durante uma viagem de duas semanas pela África, passando por Mali, Guiné, Serra Leoa, Costa do Marfim e Gana. Durante a viagem, ela era apresentada como integrante do corpo de guardas do ditador e usava um uniforme cáqui como disfarce. “O uniforme azul era o reservado às verdadeiras guardas”, diz Safia. Apesar de a garota não pertencer ao quadro de seguranças, Mabrouka a ensinou a usar um fuzil Kalashnikov, uma arma de fabricação soviética.
VIOLÊNCIA
Kadafi, que chegou a ter 400 guarda-costas mulheres, também
costumava usar as seguranças como alvo de abusos sexuais
Questionada se estaria disposta a prestar depoimento num tribunal, Safia diz que gostaria, mas sabe que ficaria marcada para sempre. “A mulher é sempre considerada a culpada”, acredita Safia. “E Kadafi ainda tem seus seguidores.” Quanto ao passado de escrava sexual, quanto mais recorda, mais diz que gostaria de esquecer os tempos sob o jugo do ditador, que com frequência organizava para seus convidados festas à moda bunga bunga – o mesmo estilo que ensinou ao ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi. Safia diz que não participava das festas, nas quais era comum a presença de modelos italianas, belgas e africanas. Ela afirma também que Kadafi mantinha relações sexuais com outros homens e estava sempre sob efeito de cocaína: “Ele não dormia jamais.” Safia não esclarece esse ponto, mas há relatos de que Kadafi também era usuário contumaz de Viagra.
Durante os cinco anos em que viveu como escrava sexual de Kadafi, Safia conseguiu visitar a família em quatro ocasiões. Na última, em 2009, com a ajuda do pai, ela fugiu do país rumo à França, disfarçada de anciã. Um ano depois, voltou clandestinamente à Líbia, mas acabou fugindo de novo, em abril de 2011, desta vez para escapar da mãe, que queria casá-la com um parente idoso, viúvo. Abrigada na Tunísia, se casou em segredo com um rapaz jovem. O casal pretendia viver em Malta ou na Itália, mas os conflitos que sacodem o mundo árabe os separou. Sem notícias do marido e com o futuro incerto, Safia relembra sua reação à morte do ditador: “Quando vi o cadáver de Kadafi exposto à multidão, senti um breve prazer. Depois, veio um gosto amargo na boca.” Hoje, Safia não tem dúvidas: seria melhor que o ditador não tivesse sido executado no momento da captura, mas sim preso, para ser julgado por um tribunal internacional.
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