29/04/2013 08h38
- Atualizado em
29/04/2013 13h12
'Faço porque gosto', revela garota de programa recém graduada em letras
Lola Benvenutti mantém blog em que relata experiências com seus clientes.
Formada pela UFSCar em São Carlos, jovem tenta quebrar tabu sobre sexo.
Felipe Turioni
Do G1 São Carlos e Araraquara
Gabriela
Natália da Silva, ou Lola Benvenutti, se formou no curso de letras na
UFSCar, em São Carlos, SP, mas optou por fazer carreira como garota de
programa (Foto: Felipe Turioni/G1)
Ela tem 21 anos, é recém-formada em letras pela Universidade Federal de
São Carlos (UFSCar), exibe em tatuagens pelo corpo frases de Guimarães
Rosa e Manuel Bandeira, adotou como pseudônimo um nome que faz
referência a um personagem do escritor russo Vladimir Nabokov e assume,
sem problemas, ser garota de programa. Gabriela Natália da Silva, ou
Lola Benvenutti,
mantém um blog
em que escreve contos baseados nas experiências com seus clientes e
chama a atenção ao tentar quebrar o tabu do sexo. “Sempre gostei de
sexo, então tinha um desejo secreto de trabalhar com isso e não há nada
mais justo, faço porque gosto”, afirmou em entrevista ao
G1.
Lola Benvenutti mantém blog com histórias dos
clientes em São Carlos (Foto: Felipe Turioni/G1)
A realidade de Gabriela sempre foi diferente da vida de uma parcela das
garotas de programa que são universitárias e optam por se prostituir
para manter as despesas com os estudos. "Tem uma categoria nos sites de
acompanhantes que são de universitárias e fazem isso porque fazem
faculdade particular e precisam pagar, mas eu nunca precisei disso, sou
inteligente, fiz faculdade, optei por isso, qual o problema?",
questionou.
Natural de Pirassununga (SP), se mudou para
São Carlos
para fazer faculdade, mas por temer algum tipo de retaliação resolveu
manter sua identidade como prostituta com discrição até concluir o
curso. “Fiquei com um pouco de medo de isso reverberar de alguma forma
na faculdade, então achei melhor terminar a graduação para colocar o
blog no ar”, disse.
O site recebe cerca de duas mil visitas por dia e é nele que Lola posta
sua rotina como prostituta. Entretanto, vê diferença entre sua história
e o fenômeno Bruna Surfistinha, pseudônimo de Raquel Pacheco,
ex-prostituta que fez fama na internet e teve sua história publicada em
livro e roteirizada em um filme. “Ela teve uma vida diferente da minha,
com outras oportunidades”, comentou.
Além de manter seus contos e servir como contato entre seus clientes,
que chegam a cinco por dia, o blog serve também para levantar discussão
sobre o prazer no sexo. “As pessoas são hipócritas, vivem de sexo, veem
vídeo pornográfico, mas não falam porque têm vergonha. Um monte de
mulher entra no blog e fala que adoraria fazer o que eu faço, mas não
tem coragem; e dos homens escuto as confissões mais loucas e cada vez
mais esse tabu do sexo é uma coisa besta”, avaliou.
Barreiras
Apesar da escolha em ser uma profissional do sexo, Gabriela não
desistiu de seguir carreira acadêmica ou dar aulas após a conclusão do
curso de letras. “Também quero dar aula, mas por hobby, e além disso
também tem a questão financeira, porque dando aula hoje você quase não
se sustenta”, analisou. “Acho que as duas coisas são difíceis de casar, é
muito difícil que uma escola que sabe o que eu faço me permita
trabalhar com eles, vou ter que derrubar barreiras”.
Ainda este ano, ela pretende se mudar para São Paulo, onde vai
continuar trabalhando como garota de programa e acumulando um mestrado
na Universidade de São Paulo (USP). “Cansei um pouco de São Carlos e
agora quero outras coisas, tanto que o mestrado para o qual estou
estudando é na USP, converso com alguns professores e quero pesquisar na
área de prostituição ou fetiche”, considerou.
Esse tipo de assunto, segundo ela, já é seu objeto de estudo desde a
adolescência. “Desde os 14 anos estudo o sadomasoquismo, que hoje está
ficando mais popularizado com ajuda do livro ‘Cinquenta Tons de Cinza’,
que é marginalizado para quem curte, mas abriu um leque para as pessoas
que não conheciam”, explicou.
Lola Benvenutti considerava sua virgindade um
fardo (Foto: Reprodução/Lola Benvenutti)
Interesse pelo sexo
O interesse precoce por sexo começou com uma vontade íntima de deixar
de ser virgem, o que considerava ser um ‘fardo’. “Desde os 11 anos
queria me livrar desse fardo, mas perdi a virgindade com 13 anos e a
primeira vez foi péssima, com um homem de 30 anos que conheci pela
internet”, relembrou.
No início, Gabriela ficou em dúvida sobre o prazer causado pelo
sexo.“Não fiquei confortável, fiquei um tempo sem fazer pensando em como
era possível as pessoas falarem tanto disso, mas aí depois de um tempo
eu fui gostando e a percepção mudou”, revelou.
Segundo Gabriela, nunca houve um episódio em sua vida que despertasse
um interesse incomum para sexo. “Todo mundo fica me perguntando qual foi
o fato que desencadeou isso, eu respondo que nada, meus pais foram
ótimos, tive uma ótima educação, entrei na faculdade direto, fiz uma boa
universidade e só”, garantiu.
Relação com a família
Como a personagem Tieta, da obra de Jorge Amado, Lola causa alvoroço
quando retorna para sua cidade natal, mas a relação com a a família
atualmente é estável. “Eu não vou muito pra lá, sinto que toda vez que
vou, levanto uma poeira de discórdia e os vizinhos ficam comentando.
Minha mãe já desconfiava porque nunca pedia dinheiro para ela e a
relação foi muito mais difícil porque ela se importa muito com o que os
outros dizem, mas a gente se fala”, disse.
Com o pai, militar da reserva, há uma relação de respeito e separação
entre Gabriela e Lola. “Meu pai ficou seis meses sem falar comigo, eu
achei que fosse pra vida toda, mas aí teve a minha formatura e ele veio.
Na ocasião, disse que a filha dele era a Gabriela, não a outra,
deixando bem claro que não compactua com isso. Mas ele ficou do meu lado
e acho ele um herói porque não me abandonou”, confessou.
Gabriela Natália da Silva, ou Lola Benvenutti, se formou no curso de letras na UFScar (Foto: Felipe Turioni/G1)