sexta-feira, 9 de julho de 2010

Caverna da Alemanha - Parte 04

Em uma corda sobre o abismo


'Riesending' (Coisa gigantesca) é como se denomina a maior caverna da Alemanha. O termo singelo representa um reino de escuridão, descoberto há poucos anos, e ainda muito longe de ser compreendido em toda a sua dimensão. Uma equipe de GEO desceu por cordas no misterioso labirinto, e ajudou a instalar um sistema de comunicação, para que os pesquisadores possam avançar rumo ao desconhecido


Por Lars Abromeit (Texto) e Carsten Peter (Fotos)

OS PRIMEIROS METROS da escalada já são desalentadores. Ainda de pé no chão do precipício, puxo nervosamente na corda, mas ela se estica tanto que não consigo subir nenhum centímetro. Por fim, consigo fixar os spits e começo a flutuar. Subo pedaço por pedaço, ofegante, xingando. Dez puxadas ascendentes. Pausa. Continuar.
Imensas projeções das paredes aparecem ao meu lado, iluminadas pela lâmpada do meu capacete. Poços laterais mergulhados no desconhecido. Pontas rochosas, formações enrugadas. Rostos de calcário. Tudo passa lentamente por mim.
A monotonia do movimento na corda me obriga a pensar. Infelizmente. Mas agora não quero pensar, menos, não muito. Não quero imaginar que tipos de esforços ainda nos aguardam, ou as alternativas que podemos ter que enfrentar. Um motorista também não fica imaginando o que aconteceria, caso perdesse o controle da direção a 200km/h. Pensar, raciocinar é estafante. Mas não consigo evitar: é como se a escuridão me obrigasse a uma introspecção.
OS PERIGOS DAS PROFUNDEZAS. Uma escorregadela nas pedras molhadas. Um bloco de rocha que se solte. Uma perna quebrada, e então? Os melhores socorristas de montanhas e espeleólogos da Europa precisariam ser acionados para tirar um ferido dessa "Coisa gigantesca". E até eles seriam impotentes se um desabamento fechasse os poços inferiores, se uma inundação súbita cobrisse uma das passagens estreitas.
Os especialistas conhecem os riscos. Nada pode acontecer, dizem. Mas eles já foram expostos diversas vezes aos poderes do submundo. Por exemplo, certa vez, eles dormiam no acampamento 1, quando, subitamente, a parede da caverna começou a vibrar, porque os rios de água do degelo corriam furiosos por corredores mais profundos. Em outra expedição, uma gigantesca onda de água desabou em um dos poços, no qual dois espeleólogos ainda balançavam, pendurados nas cordas.
Trabalho subterrâneo: Johann Westhauser perfura a rocha a 100m de profundidade para instalar mais um spit, uma pinça de segurança
Eles não são cientistas pagos para descobrir estranhos micróbios, ou coisas maravilhosas no subterrâneo. E nem acreditam em fábulas sobre campos de energia ou poderes mágicos da montanha. Sem dúvida, a profundeza tem um estranho efeito de "aspiração", diz Matthalm. Mas ele não consegue sentir nada de místico nisso. Em sua opinião, tal sensação se deve, simplesmente, ao fato de que a pessoa está longe das turbulentas correrias de seu cotidiano.
Tão distante "que é possível sentir o silêncio como um enorme fardo". E que as correntes de ar e o barulho das cachoeiras parecem soar como vozes humanas.
Mas, se nem a curiosidade científica, nem o misticismo, atraem os espeleólogos a perscrutar as profundezas, por que então eles se expõem, suportam, se frio, a umidade, a escuridão? Por que mantém sua luta constante contra o medo? O que os leva, há anos, a avançar cada vez mais pelos corredores e poços da "Coisa gigantesca"?
Eles são gerentes, engenheiros, peritos em Geodésia, e engenheiros físicos, entre 30 e 50 anos. Durante a semana, estão sentados em algum escritório; muitos têm famílias. Para eles é complicado achar tempo, duas ou três vezes por ano, para fazerem um excursão juntos durante a curta estação do verão, entre junho e o final de outubro. Nesse período a Riesending está livre de neve.
Mas eles dão um jeito, porque são dominados pela perspectiva de ainda descobrir, no coração da Europa, e em pleno século XXI, um perímetro inexplorado e desconhecido. Uma porção de terra incógnita em um país em que vivem, em média, 231 pessoas por km².
"A Espeleologia é a viagem espacial do homem modesto", declarou Matthalm certa vez. "Um dos últimos refúgios de nossa era para o anseio purista de amplidão, do desconhecido, de encontrar um lugar aonde nenhum ser humano jamais colocou os pés antes de você".

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